(os textos assinados são da exclusiva responsabilidade dos seus autores)

Leia aqui a homenagem da Fundação António Quadros a António Telmo.



sexta-feira, 25 de maio de 2012

TEMPOS DE HOJE, 5

















Caleidoscópio

Cynthia Guimarães Taveira

Quando o destino nos conduz para diversas mortes e, quando delas renascemos, a consequência é que o mundo passa a ser caleidoscópico. Caleidoscópico no sentido em que deixa de ter apenas uma dimensão. Quando nascemos apenas como corpo ele tem apenas uma dimensão: a cara da mãe surge-nos no berço a sorrir e ela é apenas uma cara que reconhecemos e que sorri. Não tem profundidades complexas nem níveis de entendimento. Os anos passam e a vida vai desdobrando-se em múltiplos sentidos. O caleidoscópio está sempre a girar e os desenhos são seres vivos que geram outros em sucessão, a partir de um centro. Para os que deixaram que a semente da Poesia se desenvolvesse dentro de si, facilmente a reconhecem tal qual o espírito que sopra sobre águas. Ela atravessa a cidade num passeio, ou o campo, ou as estrelas. O mundo é composto de Poesia. Para os místicos, para além dessa poesia, ele é composto pelas presenças que, mais do que pressentidas, se sentem. Para o Artista, para além dessa Poesia e dessas presenças, o mundo é composto de mudança, como disse o nosso Camões. O que ele vê é que presenças ancestrais, carregadas de poesia, o cercam e o amam, o possuem, a ele se unem para que a obra se faça. Quando Deus quer e o homem sonha, como escreveu o nosso Pessoa, o que existe é uma união entre o artista e o divino, núpcias apenas possíveis apenas pela Poesia ou pelo sonho. É num plano onírico de vigília que o mundo se apresenta como um caleidoscópio criativo. É possível cristalizar alguns momentos em arte. Subtilizar a matéria e materializar o subtil. Aquilo que o artista faz é apenas uma ínfima parte daquilo que ainda tem de ser feito. Como se potencialmente todos os momentos de um caleidoscópio girando eternamente fossem possíveis de agarrar, de se tornarem Ser, como se o mundo fosse um grande campo de borboletas mas só algumas fossem apanhadas, e assim cristalizadas pudessem, enfim, ser observadas na sua variedade e multiplicidade de cores e formas.

No filme A Festa de Babette de Gabriel Axel, a artista, uma cozinheira que transforma os alimentos em arte, a páginas tantas diz: “Um Artista nunca é pobre.” Frase que preenche todo o filme e todo o calor da cozinha onde graciosamente ela se move. Um artista nunca é pobre porque está sempre preenchido por essas presenças e essas escutas. O caleidoscópio brilha mais intensamente e move-se talvez mais rapidamente, uma vez que de alguma maneira a arte contribui para a verdadeira evolução do mundo. Tornando Seres todos os momentos em que o humano e o divino se encontram na Poesia e no Sonho.

Hoje, pensar e sentir assim, é considerado retrógrado e fantasista porque a Arte se tornou num aspecto lúdico, num jogo de palavras, cores, formas e sons. Pensa-se e efectua-se aquilo a que se chama arte com a ligeireza e a leviandade com que se chuta uma bola para longe. Na maioria das vezes os ateliers estão vazios de presenças, apenas o auto-denominado artista lá se encontra brincando com os pincéis, ou com as palavras num eco que é só silêncio oco. Perdeu-se na grande maioria dos casos a noção de divino, de sagrado. Recuperar essa dimensão é, também, recuperar uma companhia. Mas não é uma companhia fantasista como um “amigo imaginário” que apenas tem como função o nosso afastamento da loucura. Essa companhia tem uma existência tão concreta como a nossa. Tem uma vontade tão ferrenha quanto a nossa, obriga às lutas com o anjo, à discussão com ele, à procura de uma harmonia com ele. Para a psicologia, isto é uma psicose, tal é o grau de dessacralização com o qual o homem é confrontado nos nossos dias. Porém, esse mesmo psicólogo é capaz de admirar Dante, Camões, Pessoa, não fazendo a mínima ideia da complexidade e da dinâmica de vida que estão por detrás da criação. Quando Camões canta o Amor, canta a Dama amada, não canta uma fantasia infantil, canta o mais alto grau de Amor que humanamente conseguimos alcançar: todo esse amor é projectado para um plano divino e dele, em simultâneo, é seu produto. Se um psicólogo conseguisse entender isso transformar-se-ia num Camões em vida, com os seus altos e baixos e as suas viagens astrais entre terra e céu e não havia psicologia que lhe valesse, nem auto-estima que procurasse e a criação não mais apareceria como terapia para um melhor enquadramento no mundo. A criação apareceria como o único propósito do mundo e o olhar caleidoscópico não seria visto como fuga, remendo, catarse, escape mas sim como o mundo tal qual ele é, na sua riqueza original. Por isso, andarmos um passo atrás na nossa civilização é, sem que o saibamos, andar dois para a frente, ao contrário do que actualmente tendemos a fazer: dar um passo à frente andando para trás. Chegámos a um impasse de passos e toda a tensão sentida no Século XIX, entre um progresso dessacralizado e um passado que é só memória, permanece em pleno século XXI. O caleidoscópio, esse está sempre lá, à nossa espera, do nosso olhar e do nosso sentir.

quinta-feira, 24 de maio de 2012

ESTE SÁBADO...

 

 

 

 

 


 

 

 

II ciclo de estudos em homenagem a António Telmo

O legado da Renascença Portuguesa: livros e autores Março a Novembro de 2012
Biblioteca Municipal de Sesimbra

 
26 de Maio, 15 horas.
Colóquio Da Cartilha à Gramática
 
Oradores:

Ponces de Carvalho – João de Deus e a didáctica da Cartilha Maternal
Isabel Xavier – A poesia de João de Deus
Rodrigo Sobral Cunha – A Gramática Secreta da Língua Portuguesa

Apresentação das

Actas do IV Colóquio luso-galaico sobre a Saudade por Renato Epifânio

quarta-feira, 23 de maio de 2012

AFORISMOS, 137

Por Eduardo Aroso

Filosofia e arte são universais. Todavia, negar uma filosofia situada – a portuguesa, no caso que nos interessa – seria o mesmo que falar da não existência de uma música portuguesa, de uma arte portuguesa, de uma poesia portuguesa. O singular não tem que excluir o universal, pois este forma-se das relações daquele, um interessante casticismo, como lhe chamou Unamuno. Só pelo particular o vazio, que muitas vezes é o chamado geral, se desvanece para dar lugar ao ser, ao ser algo, tal como um corpo composto de funções e órgãos vários. A alma desse corpo, que o envolve e sustém, é a verdadeira universalidade que tudo toca, depois de preenchido o nada-geral, o homogéneo de coisa nenhuma, a universalidade que irmana e torna luminosas as particularidades.

terça-feira, 15 de maio de 2012

DIA 27 DE MAIO... ACONTECE














No próximo dia 27 de Maio, domingo de Pentecostes, realiza-se, a partir das 11h00, a 22ª Festa do Espírito Santo no Convento Velho da Arrábida, com organização da Associação Agostinho da Silva-Convento Sonho e Fundação Oriente-Convento da Arrábida. Neste dia serão lidos e cantados poemas de António Quadros e Agostinho da Silva e será prestada uma homenagem à escritora Dalila Pereira da Costa, falecida no passado dia 2 de Março. Estarão presentes diversas personalidades ligadas à Associação Agostinho da Silva, ao Círculo António Telmo, à Escola Aberta Agostinho da Silva, à Fundação António Quadros e ainda à Universidade de Évora.

domingo, 13 de maio de 2012

EXTRAVAGÂNCIAS II, 5
















QUANDO O SOL BRILHA

Cynthia Guimarães Taveira

No outro dia foi uma ex-aluna do Mestrado em Estudos Portugueses falar à turma sobre a forma como tinha escrito a tese. Dizia ela que os livros certos, na altura da investigação, iam ter com ela de alguma maneira e isto, dizia ela, porque se encontrou no “modo de livro”, o mesmo “modo”, que, segundo a explicação dela, fazia com que uma grávida que soubesse que estava grávida, ao sair à rua, notava um número considerável de grávidas pelo passeio fora. Estariam as mulheres grávidas em “modo de gravidez”. O mundo não se havia alterado em nada, no entanto, elas de alguma maneira estariam abertas e receptivas a tudo o que à gravidez dissesse respeito.
Facilmente isto se confunde com a ideia de Rémi Boyer de que, no jardim, não há diferença entre o “dentro” e o “fora”. Mas não se pode confundir. Nesse estado de “modos”, a sua causa é o estado da Pessoa enquanto no jardim não há Pessoa alguma. Não há ninguém. Há apenas uma consciência sem Pessoa. Os acontecimentos desenrolam-se para além da vontade ou do desejo. Os próprios acontecimentos se situam na esfera do Ser. É o momento das constatações e não das intervenções. Sendo que essas constatações são, enfim, a grande intervenção, o grande raio que cai do céu. Quando no jardim, não há diferença entre o “dentro” e o “fora”, isso não acontece por nenhuma obsessão ou ideia fixa. Isso acontece no próprio fluir dos acontecimentos. O jardim dialoga com o jardineiro, não num mero jogo de espelhos, mas num autêntico processo criativo em que a acção e a reacção são apenas Um. O mundo não responde ao “interno” como se fosse uma lua meramente reflexiva, nem o interno reage ou provoca o mundo como se fosse também uma lua passiva dos reflexos mundanos. Um mundo reflexivo é um mundo semi-morto porque implica o não-movimento como estágio de morte. No jardim está tudo em movimento porque lá se encontra a Vida. Há uma finalidade última, como há sempre uma finalidade num gesto de criação. Essa finalidade última une-se à causa primeira ao ponto de não haver distinção. Há verdadeiramente um caminho dentro do caminho. Um caminho de vida dentro de um caminho de morte. Esse caminho é deveras muito estreito e apertado vivendo, no entanto, na mais pura liberdade do gesto. É um caminho sem erro porque o único erro consiste, paradoxalmente, em sair para fora desse espaço de liberdade e de silêncio de que nos fala Rémi Boyer. Não há rectificações de modo a que o objecto coincida na perfeição com o seu reflexo. Porque não há reflexos. Não é um caminho iluminado pela lua. É um caminho iluminado pelo sol.



terça-feira, 8 de maio de 2012

quinta-feira, 3 de maio de 2012

CARTA ABERTA A PEDRO SINDE
















Por Eduardo Aroso

Carta-aberta a Pedro Sinde sobre a sua comunicação Senhora da Noite – a imaginação divina, no Colóquio «Regresso a Pascoaes» (Sesimbra, 21-4-2012)

Sobre a sua intervenção intitulada Senhora da Noite – a imaginação divina, se não estivéssemos entre pessoas de pensamento, eu diria simplesmente gostei porque gostei, e tudo estaria justificado. Como não é o caso, devo dizer-lhe que fiquei impressionado pelo modo como o Pedro abordou o assunto, isto é, foi um poeta que falou de outro poeta, afinal o poeta que há em (ou que é) Pedro Sinde, e que eu já havia descoberto em O Canto dos Seres. Falou em perfeita afinidade e só assim se compreende o que disse sobre Pascoaes, nomeadamente na ideia da meia-noite, da manhã e da tarde, trazendo o inefável para o plano da comunicação para chegar a todos, é certo segundo a sensibilidade de cada um, porque creio que o que tenha havido no plano da razão terá sido captado, diria, de um modo mais uniforme.

Enquanto o Pedro Sinde falava do profundo sentido criativo que há na meia-noite, eu ia fazendo um certo raciocínio que gostaria de lhe comunicar, pois ele prende-se com outro ponto nuclear que nos motiva a todos e que é a quarta casa do horóscopo de Portugal, feito por Pessoa, e interpretado por António Telmo. Duas ou três palavras prévias para nos situarmos melhor: a 4ª casa (lar, família, ancestralidade, tradição, terrenos, estrutura psíquica ou “alicerces”), portanto uma casa de raízes, escura ou obscura, corresponde à meia-noite, opondo-se à 10ª casa (o meio-dia, a luz, a realização visível, o público, a autoridade instituída, o que é oficial). Eu que há já alguns anos me interesso pela astrologia, nunca havia reparado que se tivermos que associar o que se tem chamado filosofia portuguesa ou tradição portuguesa, será à 4ª casa, dado ser este um Movimento sempre “às escuras” no reconhecimento oficial dos meios académicos e culturais instituídos, assunto que podemos legitimamente atribuir à 10ª casa. Assim, a 4ª casa opõe-se à 10ª, mas o sentido de opor-se reveste-se de aspectos um tanto subtis, como vamos observar de seguida. Vemos assim que a tradição filosófica portuguesa e a filosofia oficial ou académica opõem-se, respectivamente, na mesma proporção e sentido que a 4ª casa do horóscopo se opõe à 10ª.

Mas vejamos o que nos diz António Telmo «Tudo quanto se pensa vaticinar para o futuro deve ser lido no quarto quadrante, com início no Fundo do céu (o nadir do horóscopo), ou seja, a quarta casa» (…) «o quarto quadrante do horóscopo é o oposto do segundo quadrante [ou seja, o que eu disse atrás, a 4ª casa opõe-se à 10ª, sendo que cada quadrante tem 3 casas, portanto a quarta parte da divisão dos 12 signos], aquele que define a época dos Descobrimentos tendo por termo Alcácer-Quibir e os Filipes. No Meio do Céu, ao alto [a 10 ª casa, isto é, o que está bem visível], está o trono simbólico de Portugal onde se sentou, ao findar do signo oceânico de Peixes, D. João, Mestre de Avis». Repare-se que não é só a característica de visibilidade que define a 10ª casa, mas também o apogeu ou máxima realização visível. Assim, na astrologia mundana corresponde, por exemplo, à casa da coroação de um rei ou eleição de um presidente da república; na astrologia pessoal significa o apogeu da carreira profissional.

Telmo contrapõe a este facto da 10ª, o trono do Mestre de Avis, a ascensão do socialismo na 4ª casa, o ponto oposto: «No Fundo do Céu (o nadir do horóscopo), que

corresponde ao ano de 1877, deu-se um acontecimento que, na altura, pode ter passado mais ou menos despercebido, mas que marca a orientação que o quarto quadrante imprime a tudo quanto, no domínio político, se passou até agora e se há-de vir a passar no futuro. Foi a fundação do partido Socialista». Prossegue António Telmo «estas conexões, por relação de opostos (do segundo quadrante com o quarto e das casas entre si, da primeira com a primeira, da segunda com a segunda *, à esquerda e à direita da linha zénite-Nadir) [ou seja a linha que vai da 10ª casa à 4ª] resultam da lei geral que faz do hemisfério inferior e nocturno a projecção, como num espelho em modo inverso, do hemisfério superior ou diurno» (…) prosseguindo o autor citando mais acontecimentos marcantes como exemplos.

Ora, é para as seguintes palavras de Telmo que eu gostaria de lhe chamar a atenção «…resultam da lei geral que faz do hemisfério inferior e nocturno a projecção, como num espelho em modo inverso, do hemisfério superior ou diurno». Se relacionarmos o que o Pedro disse no colóquio, quanto às possibilidades genésicas e primordiais da mística meia-noite em Pascoaes, a hora do caos em que tudo começa lentamente a ganhar forma (qual semente no escuro da terra que só pela manhã se vê), logo constatamos que não só o hemisfério inferior e nocturno é uma projecção, como num espelho em modo inverso, do hemisfério superior ou diurno, como (inversamente) o citado primeiro hemisfério, o nocturno, pode ser o arquétipo digamos assim, do segundo, o diurno ou superior. Ou seja, é a noite que fecunda o dia, do caos vem a obra, para que o dia, por sua vez, deixe o “sémen solar” que não arrefeça de todo a luz nocturna, sem o que haveria escuridão permanente e, consequentemente, morte.

No caso do socialismo (ligado à 4ª casa, segundo Telmo), não é ele que fecunda os acontecimentos luminosos da 10ª, é bem de ver, pelo contrário (por isso se lhe opõe), mas, e também segundo o sentido que o filósofo confere ao socialismo como dissolução total, sabemos que a 4ª casa é um fim e um recomeço, e enquanto recomeço é um útero.

Pelos exemplos apontados, creio que se compreenderá melhor a tal subtileza do sentido do aspecto de oposição astrológica de que lhe falei atrás. Os factores em causa, neste caso, o sentido das casas com os seus acontecimentos, devem sempre ser vistos como uma totalidade mais abrangente pois, por exemplo, nada significa dizer alto sem a noção de baixo, ou frio sem a noção de calor. A 4ª casa, sendo o inferno do horóscopo, no sentido do ponto mais baixo e escuro (rege também aos cemitérios, poços e escavações) é também, como disse, o útero de tudo, pois veja-se que a mãe está relacionada a esta casa e à Lua.

O que eu gostaria é que o Pedro, tomando a sua fecunda exposição do tema acima referido, reflectisse nestas relações, onde a meia-noite em Pascoaes parece ter o sentido uterino que é já a vitória sobre a dissolução ou caos, na liberdade feminina e divina de tudo recomeçar, já para não falarmos da observância dos ciclos. Peço-lhe que não entenda esta minha sugestão como “exortação de mestre” (pois em volta do mestre temos estado), mas de alguém que viu na sua comunicação do dia 21 de Abril, em Sesimbra, uma tremenda relação de Pascoaes com aquilo que podemos ler no horóscopo de Portugal.

* Há aqui um lapso que deve ser entendido mesmo assim, isto é, como lapso, pois António Telmo, até por descrições anteriores, vê-se que conhecia mais que suficientemente o assunto do grafismo do horóscopo. Quando diz que a primeira casa se opõe à primeira, queria dizer que se opõe à sétima, bem como a segunda se opõe à oitava.

Um abraço cordial

Eduardo Aroso

23-4-2012

AFORISMOS, 136

















Eduardo Aroso

Há nas profecias do Bandarra de Trancoso e na hipergnose do Espírito Santo uma correspondência. Nelas convergem as promessas de realização e de revelação. Se, no primeiro, o tempo é, por assim dizer, a seiva da profecia “desviada” do tempo histórico, no segundo, sejam quais forem os desvios dos tempos, o erro se sublima em perfeição para novo rumo.

quarta-feira, 2 de maio de 2012

FAZ HOJE ANOS QUE NASCEU ANTÓNIO TELMO













“Em qualquer ponto da terra que eu me encontre estou no centro comum a ambos, pois a distância que me separa do horizonte é em todas as direcções a mesma e também é a mesma em qualquer ponto do Céu envolvente. No entanto, outro ser que me é exterior está mais à direita ou à esquerda, à frente ou atrás desse centro que eu ocupo. Mas eu sei que do seu ponto de vista ele também se supõe no centro. As duas perspectivas provêm da limitação do olhar e são um engano. Se eu supuser a extensão infinita em todas as direcções, então a centralidade de cada ser aparece como verdadeira e objectiva.

Nasce daqui a noção de um espaço infinito, uma extensão vazia infindável. Não somos capazes de imaginar esse espaço, de o figurar como uma imagem e daí chamarmos-lhe um «conceito». Todavia, é a imaginação que supõe mais a quantidade de espaço para lá do limite do meu olhar e mais ainda para lá, do mesmo modo que posso somar sempre mais uma unidade a um número dado.”

António Telmo, O Portugal de António Telmo, Guimarães Edições, 2010, pág. 117